O poeta Francisco Mangabeira, nascido em Salvador no dia 8 de fevereiro de 1879 e falecido prematuramente em 27 de janeiro de 1904, deixou-nos obra singular, ainda hoje pouco conhecida. Seu livro Tragedia Epica (Guerra de Canudos) sairá em breve na coleção “Arquivo Decadente” pela editora Nephelibata. O poema abaixo (na ortografia antiga) foi colhido no livro Panorama do movimento simbolista brasileiro, vol. II, de Andrade Muricy. [ B.S.]
OTHELO
(NOITE DE FEBRE)
Entrei, e vi um vulto horrifico e felpudo
De guarda no portão...
Era negro... Pensei ver um escravo mudo
Vestido de velludo
Naquelle enorme cão.
Ao ver-me, levantou-se, e a cauda sacudindo
Ciumento no ar,
Entrou pelo salão feerico, rugindo...
Quando surgiste rindo
Com musicas no andar.
A sala fulgurosa, ardente e purpurina,
Cheia da luz do gaz,
Lembrava o inferno atróz onde o pavor domina
Tú eras Proserpina
E eu era Satanaz.
Quiz, tremendo de amor, ciume e desespero
Possuir-te por fim...
Mas ouvi um rosnar enraivecido e fero...
E o cão, como Cerbero,
Olhava para mim...
Tremi, e recuei naquelle mesmo instante...
Vendo, cheio de dor,
O cão lamber-te os pés, como um perdido amante
E rosnar, anhelante,
Babando-se de amor...
Tu cerravas de manso os olhos e o acholhias
Emquanto elle, a gemer,
Roçava a cauda negra em carnes tão macias
Que se tornavam frias,
A suar e a tremer.
Tinhas febre, e teu cão ditoso delirava
Cheirando-te a nudez...
Pois teu vestido branco ao chão já se arrastava...
Tú eras sua escrava
E elle teu rei talvez.
Cahiste a soluçar, e o cão libidinoso,
Como um satyro vil,
Mordeu-te, e saboreou-te o amor quente e glorioso,
Espojando-se ancioso
Em teu corpo gentil.
Ao ver-me, arreganhou os dentes com loucura
Rosnando feio e atróz...
Tem receio do amor ardente que tortura,
Oh Desdemona pura
Teu Othelo feróz...
Pois, quando elle se ergueu, na sala um medo interno
Senti nesta alma vã...
E vi-te Proserpina e ao teu Cerbero terno
Expulsando do inferno
A mim, que sou Satan.
A mim, que sou Satan.
Manáus, 5 de Abril de 1902.
seis eh um xato num tem nada ver nu ki eu prokuro ninguem conhece a poesia baladas dele nao
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